domingo, 5 de abril de 2015


                                          ''A Fé Religiosa''


No seu aspecto religioso, a fé é a crença nos dogmas particulares que constituem as diferentes religiões, e todas elas têm os seus artigos
de fé.
Nesse sentido, a fé pode ser racionada ou cega.

A fé cega nada examina, aceitando sem controle o falso e o verdadeiro, e a cada passo se choca com a evidência da razão.
Levada ao excesso, produz o fanatismo.

Quando a fé se firma no erro, cedo ou tarde desmorona.
Aquela que tem a verdade por base é a única que tem o futuro assegurado, porque nada deve temer do progresso do conhecimento, já que
o verdadeiro na obscuridade também o é a plena luz.
Cada religião pretende estar na posse exclusiva da verdade, mas preconizar a fé cega sobre uma questão de crença é confessar a
impotência para demonstrar que se está com a razão.

Vulgarmente se diz que a fé não se prescreve, o que leva muitas pessoas a alegarem que não são culpadas de não terem fé.
Não há dúvida que a fé não pode ser prescrita, ou o que é ainda mais justo: não pode ser imposta.
Não, a fé não se prescreve, mas se adquire, e não há ninguém que esteja impedido de possuí-la, mesmo entre os mais refratários.
Falamos das verdades espirituais fundamentais, e não desta ou daquela crença particular.
Não é a fé que deve procurar essas pessoas, mas elas que devem procurá-la, e se o fizeram com sinceridade a encontrarão.

Podeis estar certos de que aqueles que dizem:
“Não queríamos nada melhor do que crer, mas não o podemos fazer”, apenas o dizem com os lábios; e não com o coração, pois ao mesmo
tempo em que o dizem, fecham os ouvidos.
As provas, entretanto, abundam ao seu redor.
Por que, pois, se recusam a ver? Nuns, é a indiferença; noutros, o medo de serem forçados a mudar de hábitos; e na maior parte, o orgulho
que se recusa a reconhecer um poder superior, porque teria de inclinar-se diante dele.

Para algumas pessoas, a fé parece de alguma forma inata: basta uma faísca para desenvolvê-la.
Essa facilidade para assimilar as verdades espíritas é sinal evidente de progresso anterior.
Para outras, ao contrário, é com dificuldade que elas são assimiladas, sinal também evidente de uma natureza em atraso.
As primeiras já creram e compreenderam, e trazem,ao renascer, a intuição do que sabiam.
Sua educação já foi realizada.
As segundas ainda têm tudo para aprender: sua educação está por fazer.
Mas ela se fará, e se não puder terminar nesta existência, terminará numa outra.

A resistência do incrédulo, convenhamos, quase sempre se deve menos a ele do que à maneira pela qual lhe apresentam as coisas.
A fé necessita de uma base, e essa base é a perfeita compreensão daquilo em que se deve crer.
Para crer, não basta ver, é necessário, sobretudo, compreender.

A fé cega não é mais deste século.
É precisamente o dogma da fé cega que hoje em dia produz o maior número de incrédulos.
Porque ela quer impor-se, exigindo a abdicação de uma das mais preciosas prerrogativas do homem: a que se constitui do raciocínio e do
livre-arbítrio.
É contra essa fé, sobretudo, que se levanta o incrédulo, o que mostra a verdade de que a fé não se impõe.
Não admitindo provas, ela deixa no espírito um vazio, de que nasce a dúvida.

A fé raciocinada, que se apóia nos fatos e na lógica, não deixa nenhuma obscuridade: crê-se, porque se tem a certeza, e só se está certo
quando se compreendeu.
Eis porque ela não se dobra: porque só é inabalável a fé que pode enfrentar a razão face a face, em todas as épocas da Humanidade.


* Kardec referia-se ao século passado, de maneira que a sua afirmação é hoje ainda mais adequada. (Nota do Tradutor)



Texto retirado do “Evangelho Segundo o Espiritismo” – Allan Kardec (Cap. XIX – A Fé Que Transporta Montanhas) – Tradução: Herculano Pires / Editora EME.

 

“Nascer, morrer, renascer ainda e progredir sem cessar, tal é a lei” Allan Kardec

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