sexta-feira, 3 de julho de 2015

A MOÇA DE CATANDUVA

Conta Divaldo Franco: 
       
       Oportunamente fui pregar em Catanduva a quele tempo viajava-se muito em trens noturnos. 

Eu o tomava em Catanduva e ia até São Paulo. 
Era uma viagem razoavelmente confortável.

        Numa das vezes em que estive naquela cidade, ao regressar, Dona Lola Sanchez e outros confrades me levaram até a estação ferroviária. 

O trem saía as 22:30 hs.
        Quando cheguei à plataforma de embarque chamou-me a atenção uma senhora camponesa despedindo-se da filha. 

A jovem era uma daquelas meninas bonitinhas, bem modestas, do interior, vestida com simplicidade, o cabelo liso, partido ao meio e muito mimosa.

        A mãe abraçava-a e despedia-se, beijava-a e abraçava-a de novo e  a cena comoveu-me. 

Fiquei olhando a ternura da mãe com a filha de dezoito ou dezenove anos, mais ou menos.

        O trem deu o primeiro sinal de partida e me despedi dos amigos. 

A mocinha também subiu no trem, apressadamente.
        O vagão não estava muito cheio. 

Eu me sentei à janela, do lado da plataforma para acenar aos amigos, enquanto que ela sentou-se do outro lado, sozinha.

       Quando a composição começou a mover-se, eu vi que da mãe partia um fluido vaporoso, como se fosse uma nuvem alongada,  a idea era de um arminho muito grosso de meio metro de circunferência, que brotava do centro cardíaco, entrava no trem e se implantava na moça.

       A medida que o veículo se movia, aquele fluido foi se afinando, quase desaparecendo.

        A mãe dava-lhe adeus e chorava; uma despedida quase trágica. 

A mocinha chorou um pouco e depois recostou-se, preparando-se para algum repouso, desde que a jornada seria longa: umas sete horas em média.

        A viagem prosseguiu.
        Quando chegamos a Araraquara, houve uma parada. 

Um rapaz entrou, daqueles tipos de conquistadores, num jeito de quem olha a pessoa e despe-a. 

Ele abriu a porta, entrou, olhou a todos, deteve-se na moça - o olhar dele era tão típico que me chamou a atenção. 

Examinou-a atentamente, ajeitou-se e foi sentar ao lado dela, que estava junto à janela.

        Passou o tempo. 
Fiquei distraído com outras coisas e quando percebi, ele havia passado o braço por trás da poltrona e se lhe chegara mais perto. 

Ela, tímida, encolheu-se um pouco.
        Eu pensei: Que coisa estranha esse indivíduo! 
Parece-se a um desses conquistadores baratos, aliciadores de menores...

        Dentro em pouco ele já estava conversando com a jovem. 
Refleti, comigo mesmo: 
Meu Deus, a coitada vai cair nas malhas desse sedutor, porque, totalmente desarmada, não saberá defender-se.

        Ele parecia muito loquaz. 
Numa estação mais adiante, ele saltou, comprou frutas, ofereceu-lhas. 
Ante a gentileza, a moça ficou animada.

        Vendo a cena eu orei, temendo o que viria depois; Meu Deus não deixe que ela seja seduzida - eu rogava. 

Recordei-me da sua mãe, e a lembrança me sensibilizou tanto que prossegui orando, pedindo a Jesus que a protegesse.

        Fiquei a imaginar: Certamente ela é uma mocinha que vai tentar a vida em São Paulo, ameaçada de cair nas armadilhas de um sedutor profissional. 

Fiquei orando, pedindo por ela.
        De repente, entrou um Espírito vestido à espanhola, à antiga, tipo sevilhana, uma mantilha de renda, um vestido longo, muito bonito. 
Ela era uma Entidade veneranda. 
Olhou para mim e para o par.

        - A tua prece foi ouvida - falou-me.
       Dirigiu-se para os dois e começou a aplicar passes na moça. 
Eu, então, mentalmente, dizia: Não é nela; é no homem.
 Afaste-o dela!
        O Espírito olhou-me, sorriu e continuou aplicando os passes na moça. Terminou, fez-me uma saudação e desapareceu.

        Eu fiquei frustrado, pensando que algo estava errado.
        De súbito, porém a moça deu um soluço, teve um engulho e vomitou no homem, atingindo-o de alto a baixo.

        O homem deu um salto e gritou:
        - Miserável! Veja o que fez! E saiu furioso tentando limpar-se.
        A moça, muito sem jeito, virou-se para mim e justificou-se:
        - Veja, eu nunca enjoei.

        Tirei um lenço, dei-o para ela e entendi a técnica que o Espírito usara. 

Sentei-me ao seu lado, para bloquear o lugar e perguntei-lhe:
        - Minha filha, você está doente?
        - Não senhor, de repente me deu uma coisa ... logo aquele rapaz, tão delicado...
        - Você o conhece?
        - Não senhor.
        - Você está indo para onde?

        - Estou indo para São Paulo - explicou-me - para trabalhar como dama de companhia numa casa e, aquele rapaz, muito educado, veio dar-me o endereço de uma tia dele que recebe moças como pensionistas. 

Ele estava até me oferecendo um emprego melhor, porque ele tem a missão de contratar moças para trabalhar e a tia recebe-as. 

Ele estava explicando-me quando aconteceu isto.
 O que é que eu faço agora?
        - Você vai ser dama de companhia - respondi-lhe. 
Este rapaz é um aliciador de moças para a loucura do sexo desregrado.
        - Expliquei-lhe o que era e ela ficou muito surpresa.

        - Mas, não é possível, ele é tão delicado, respondeu-me
 - Falou até que estava apaixonado por mim, que nunca tinha visto uma moça tão bonita como eu, que me queria levar para a casa da tia, a fim de defender-me dos "lobos" que existem em São Paulo.

        - Você vai fazer exatamente como sua mãe lhe mandou - aconselhei.
        Fiquei-lhe ao lado até chegarmos a São Paulo.
        - Quando saltamos, segui com ela. 
Neste momento, vimos o rapaz descer do trem, todo sujo, a roupa branca com enormes manchas cor de café. 
Olhei-o e perguntei-lhe, sorrindo:
        - Está melhor?
        Ele deu uma resposta a seu tipo e foi-se, enquanto eu fiquei a reflexionar na forma como os Espíritos agem.
 

Com sua atenção despertada desde o início da viagem, Divaldo registra as más intenções do homem que toma lugar junto à jovem. 

Nesse momento, Divaldo utiliza a prece em benefício dela. 

A resposta ao pedido não se faz esperar.  
A técnica de ajuda que os Espíritos amigos adotam é digna de registro. 
É que nem sempre nos é dado avaliar ou entender como se processam os atendimentos. 
Nas ocorrências do cotidiano, o homem, não raras vezes, se revolta contra certos fatos que, em geral acontecem para seu próprio benefício. 
Se a Benfeitora Espiritual tivesse aplicado o passe no homem, visando retirá-lo do lado da moça, sempre haveria a possibilidade que ele voltasse à carga. 
Agindo diretamente sobre a jovem, da forma como aconteceu, o homem retirou-se revoltado e com asco. Isso o afastou de vez. 
        A prece é o meio mais eficaz quando se deseja ser útil, especialmente quando nos faltem quaisquer outros recursos.




Do livro: Semeador de Estrelas

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